para acabar com a dupla vitimação
Há muito que me pergunto porque não avançam medidas que permitam que a vítima de violência doméstica não seja duplamente vítima.
É vítima num ciclo que se perpetua e que necessita de alimentar-se da interacção vítima-agressor. Um ciclo perverso que mantém a vítima refém do seu próprio papel. E é vítima quando quer quebrar o elo dessa cadeia. Quando procura ajuda, a vítima que escolhe permitir-se deixar de o ser, passa a ser vítima de um sistema que pretende protegê-la e apoiá-la, mas que, para tal, a afasta do seu meio, da sua casa, dos seus bens, do seu trabalho,... É um novo ciclo de vitimação e de perpetuação da interacção perversa com novos protagonistas que paradoxalmente assumem papel de protector-"agressor".
Poderá ser entendido como radical, mas, porque não um internamento compulsivo para o agressor? Porque não um programa especial de reabilitação que obrigue o agressor e não a vítima de violência a sair do seu meio, da sua casa,...
Já muito se avançou, mas muito ainda falta para fazer-se justiça. Faz-se alguma luz com a nova direcção da Comissão para a Igualdade e os Direitos das Mulheres. As vítimas não são só mulheres, mas comecemos por algum lado! Que a Elza Pais, que foi minha professora, tenha coragem e (muito) apoio do seu lado. Esperamos mudanças!
A excelente fotografia é de Elina Brotherus e esteve nos Encontros de Imagem em Braga.
13 comentários:
Olá. Com este mereces uma "chapelada". Concordo, e alargo a outras situações como os mus-tratos infantis, em que se repete todo o processo, ainda que de forma mais dolorosa e comulativamente mais gravosa - uma criança de três anos, por exemplo, não possuirá, em geral, os recursos de um adulto de 25. Aqui está uma área em que todos deveriam pensar numa nova forma de agir - muitas vezes, o mais fácil não é o mais adequado.
Só não entendo o porquê da vergonha de assumir a ideia de intrnamento compulsivo. Penso que a ideia será mesmo a de prisão preventiva, devido ao risco de continuar a cometer o crime de que é acusado. Ou não estamos a falar de crimes?
Obviamente, falava de maus-tratos e não de mus-tratos...
E com "chapelada" não te quero bater com um chapéu, mas, galantemente, tirar o meu chapéu em homenagem... Esta língua... E ainda por cima numa postagem sobre violência...
Também fico à espera duma intervenção mais eficaz.
afinal é crime, ou doença?
beijocas
marta
Agradeço a chapelada, e percebi que não metia guarda-chuva, ou pelo menos, assim esperava!
O internamento compulsivo (ic) não deveria ser exclusivo da saúde mental. A espécie de ic a que me refiro também nem deveria ser nos mesmos moldes. Falei nisso para recriar outra situação alternativa à pena de prisão. Seria melhor ter usado "tratamento compulsivo" em reclusão temporária, sei lá. É crime! Disso não há dúvida. Tenho é muitas dúvidas é relativamente à eficácia da pena de prisão per si, seja para que crime for. Esta gente deveria ser alvo de acompanhamento. O agressor pode deixar de sê-lo. A intervenção sistémica mesmo só com o agressor poderia ser uma excelente forma de potenciar outras alternativas de expressão e comunicação. Mas estou a puxar a brasa...
Olá. Ainda bem que partilhamos de algumas ideias. Idealmente, o objectivo de qualquer pena de prisão deveria ser a recuperação. De outra forma, será retaliação, e em muitos casos, demasiado leve. Quem comete um crime, deve ser punido. Como Skinner e muitos outros tão bem apontaram, a punição, por si só, não contribui para a aprendizagem comportamental. Contribui apenas, quando eficaz, para a redução do repertório comportamental. Para ser verdadeiramente eficaz, toda a punição deveria ser acompanhada pelo "ensino" (em sentido lato) da "conduta virtuosa".
Chegados aqui, o que temos: carteiristas, burlões, pilha-galinhas, violadores, assassinos, etc., cometem actos contrários à lei vigente. Como tal, deveriam ser punidos, e deveriam ter direito ao seu programa de recuperação. O que me dizes, é que quem agride a mulher, marido ou filhos, é especial? O agressor pode deixar de sê-lo - e os restantes citados não? Queres talvez rever a lista dos "recuperáveis" e definir uma de "condenados sem possibilidades de recuperação" (nesse caso, porque não matá-los de vez, contribui para o reequilíbrio das contas públicas...).
No caso concreto que trouxeste à colação, temos um agressor, e temos uma ou mais vitimas. A prática é "proteger" a vítima, colocando-a sob a alçada de quem tem o poder de a proteger. Aí reside a injustiça. Se a vítima é retirada, é porque corre perigo de novos actos. Se corre riscos de sofrer, então há riscos óbvios que o agressor reincida na sua prática. Logo deveria, ele sim, ser colocado sob a alçada de quem tem poder para o impedir de reincidir. Evidentemente, essa entidade - para já, o estado português - deveria fazer todos os possíveis para recuperar todos os que estão nessa condição - todos, sem excepção - violência doméstica, maus-tratos infantis, tráfico de droga, etc.
Agora deixo-te, porque tenho que acordar para ir trabalhar...
Este é um tema polémico.
Há medidas de afastamento que nunca são usadas. Quando são usadas ninguém verifica se são efectivadas. Impunidade!
Estes criminosos não me parecem especiais, mas sabes que ninguém é agressor sem vítima. Regras do ciclo vicioso. Por mim poderiam estar presos mas num programa especial, assim como deveria haver programas especificamente desenhados para os restantes criminosos. Ninguém pensar programas competentes para a reinserção (blá blá blá) assusta. Mesmo que não resultem, não custa tentar e, depois, avaliar. Há tantas experiências já desenvolvidas, mas não olhamos para os bons exemplos. Não é a minha área, mas espreito de vez em quando para estas janelas no mundo.
As nossas ideias evoluem em espiral...
concordo plenamente com o que diz sónia.
apenas me atrevo a levantar uma questão que é a da compulsividade ao tratamento/internamento. Será que alguém se trata ou muda só porque é obrigado? Por outro lado, a prisão há muito que é uma escola de crime... há muito que a sua filosofia de base, de reeducar, de transformar pessoas , simplesmente não existe...~
A urgência que estas situações implicam, por vezes deixam muito pouco espaço para se pensar em estratégias, frequentemente por motivos de sobrevivência...
Também não é a minha área, mas não custa nada pensar alto... é acima de tudo um tema muito sério e pertinente.
Abraços ao blog para que se continue a pensar... de vez em quando (sempre com muita humildade) atrevo-me a meter o bedelho
marta
marta, adoro quando metes o bedelho (esta expressão é das mais bizarras que há...).
É verdade que conhecemos vários exemplos da falácia dos tratamentos compulsivos (e involuntários), mas também pode potenciar-se algo em alguém através da iniciativa de outrém (Estado que pune).
Não sei bem se seria eficaz, mas um agressor poder compreender e reflectir sobre o seu ciclo de violência, experimentar outras formas de comunicação, etc... mesmo com as dificuldades que advinho, poderia ser condição da medida. Se muda ou não muda, isso já não depende de nós, não é? A autonomia é das pessoas. A nossa consciência ficaria mais tranquila porque algo foi tentado, talvez.
Pelo menos, mudar a forma dos técnicos encararem as situações, já é mudança.
Olá. Vou meter o bedelho, novamente. Têm falado aqui muito de "tratamento", para os agressores. Peço desculpa, mas quase parecem psicólogos a falar: "Então, como é que se tem sentido depois de sovar a sua mulher?!!!". Eu sou psicólogo - o jpsilva tinha razão - mas nem eu sou tão crente assim na possibilidade de alterar padrões de (dis)funcionamento adulto. Não sem o apoio de medidas de coacção muito claras. E aqui volto à carga - não acredito em vitímas das circunstâncias, quem comete um crime é criminoso, e merece punição e tentativa de recuperação. Como? Não sei, análise de sonhos, fantasmas primordiais, eletrochoques, o que funcionar... Os profissionais de trabalho social nessa área que se pronunciem.
Bom tema Guadalupe - não há uma área específica do SS relativa à Justiça que se queira pronunciar sobre boas práticas nesta área?
Há contextos que favorecem comportamentos, mas em última análise a responsabilidade é de quem age. E isso configura a responsabilidade no acto criminoso. Claro que noutros contextos sócio-históricos muito recentes tal não era assim, mas hoje é. Continuo,ainda assim a achar que esta gente (que são pessoas que cometeram crimes) tem de ser olhada também como gente que pode recriar a sua vida de forma diferente. Não sou crente em acções milagrosas mas em mudança trabalhada, co-construída. E isso dá trabalho e leva tempo.
Os profissionais desta área ainda não apareceram por aqui, mas já vão aparecendo doutras, o que é muito positivo. Continuarei a insistir (através das minhas lentes) e conto convosco.
Olá
Ainda continuo por cá. Afinal o Pedro é psicólogo! Bom nada contra, ainda bem, sinal do sétimo sentido masculino!
Bom não me quero imiscuir neste vosso tema. Mas como trabalhei, 12 anos no sistema da justiça e assiti a diversas formas de olhar a reinserção social, estou mais de acordo com o Pedro. Estas questões não são resolvidas com passes de mágica, seja por técnicas psicológicas, tratamentos penitenciários, ou outros. Aliás, a filosofia da reinserção social está em retrocesso, apesar das medidas alternativas em voga, que visam mais poupar economia ao Estado.
Neste assunto, que é grave, no entanto, devemos recordar que ainda é recente no panorama português e latinos, nas diversas abordagens, teóricas, políticas, da justiça, sociais, etc. Aina existem resquícios culturais de domínio no campo do género pacificamente aceites, por comunidades ruarais e até nas grandes cidades. Há um envolto cultural, e depois há o desvio. Será algo que deverá ser bem estudado, no sentido da mudança social e da igualdade do género. Mas é evidente, nada desculpa o acto violento. A reflexão é que tem de revelar alguma cautela e acuidade.
Ainda, lentamente, os orgãos políciais vão dando relevãncia a este crime, mas ás vezes...ai, ai, entre marido e emulher não metas a colher!
Um abraço
Mas afinal que competências, do âmbito do Serviço Social, são mobilizadas no trabalho de reinserção com reclusos e ex-reclusos. O que compete técnica ou cientificamente ao nosso campo profissional nesta área...´Que Falem os mais experientes..ou os académicos, porque não???
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