avé!
Esta semana uma aluna de serviço social declarou que procurou o curso "porque gosto destas coisas da caridade e assim...". Coitada, após a minha reacção irónica e altamente provocadora, desfez-se em explicações e desculpas. Ainda assim fiquei convencida que se enganou no edifício da cidade de Coimbra... Há dias assim!
21 comentários:
E acrescento: é pena não haver reprovações com retroactivos!
Pensa-se pequeno neste nosso ofício. As convicções e as práticas dos nossos colegas têm ainda a marca da religião. E isso vê-se claramente em muitos aspectos da actividade: os horizontes estreitos, as representações e expectativas dos profissionais face aos destinatários, a perpetuação dos papéis tradicionais, a priorização de eventos com cunho religioso e paroquial... enfim, uma série de aspectos que não visam nunca a emancipação social, cultural e ideológica das populações. É o principal veneno desta profissão, no meu ponto de vista. A ajuda ao próximo nunca pode ter subjacente um qualquer fito religioso, nem pode vestir-se de caridade ou beneficência. É tempo de acabar com as subvenções pecuniárias vitalícias sem exigir nada em troca - como é de resto o caso do RSI, por muito que a legislação esteja bem pensada. E pronto, eu podia estar para aqui a discorrer sobre isto... Se um dia quiseres que dê uma aula sobre este tema, conta comigo :)
Também fico assim, em desepero, quando oiço uma destas! e foi a primeira vez que a ouvi com todas as letras. ;-(
Enfim... Tenho tido muitas freiras como estudantes e NEM ELAS diriam uma coisa destas sobre o curso e a profissão.
Terei muito gosto em convidar-te um destes dias, até porque a tua área de intervenção se inscreve numa das minhas unidades curriculares, mas entretanto, escreve, nos tempos livres (????!!!). Pois!
exclui o último comentário meu que apareceu repetido. Só isso!
Sempre que escrevo acerca destas coisas, recebo comentários inflamados. O assunto é delicado e o meu blogue é observado de forma continuada ;)
Vou-me ficando pelas futilidades que lá vês...
Pois, acho que não tenho remédio... ainda não aprendi a estar quietinha e caladinha. Mesmo depois de tudo isto. Enfim... vou ter de aprender mais tarde ou mais cedo. E mais uma para a carneirada! Não é que me importe, mas o cheiro a lã fresca enjoa-me!
talvez, pelo contrário pudesse ser um desafio, assim tão fresca, ainda pode mudar de cor!
Os alarmes de pouco servem, cabe-nos a nós mudar as representações e consciencializar politicamente os alunos para a importância da acção tendo em vista a diminuição das desigualdades. Quanto ao RSI – pensão vitalícia?? Sinceramente não percebi, segundo algumas leituras mais radicais significa, isso sim, um retrocesso ao nível dos direitos sociais, visto se aproximar do workfare de pendor americano.
Pois é! Acabei o curso em Junho e quando colegas me perguntam qual o meu curso, respondo que tirei o curso de serviço social. A primeira reacção é uma cara do tipo "O que é isso?", acabo por dizer: sou assistente social! Todos comentam que tirei o curso para dar subsídios aos ciganos!! O nosso país é assim...
Cara S Guadalupe,
desde já os meus parabéns pelo blog, todos os dias consulto pois considero um espaço muito interessante, útil e inovador pelas ideias que transmite. Quanto ao comentario da aluna, eu ouvi isso todos os meus 5 anos de curso no ISSSP, mas o mais grave e o que provavelmente nao sabe é que infelizmente e apos 3 ou 4 anos de curso, esses comentarios e outros bem piores continuam a ouvir se. Por isso na minha opinião deveria haver maior informação sobre o curso e uma maior confrontação nos 2 primeiros anos para que se possam romper com ideias caritativas, assistencialistas e funcionalistas.
Parece que te estou a ver.
Força SGuadalupe. Gabo-te a capacidade de insistir. Se nós próprios desvalorizamos a nossa intervenção...
Um abraço marta
É um trabalho continuado de desconstrução...
Quanto à discussão paralela... A opinião pública anda envenenada com os casos das famílias que são beneficiárias do RSI ad eternum. As histórias públicas relativas a famílias de ciganos extremam ainda mais a opinião. Considero que a política merecia uma avaliação para casos que fossem beneficiários há mais de x tempo... Há situações verdadeiramente assustadoras.
Já tinha por aqui passado a espreitar mas com este post não resisti a comentar... Realmente é lamentável que alguém pense desta forma... Igualmente lamentável é isto acontecer em pleno século XXI e ainda mais lamentável é ser uma aluna do próprio curso.... Enfim... Eu começo este ano em serviço social e quando digo qual o meu curso, os comentários são do tipo:" Isso dá para quê? Mais uma para o desemprego..."
Enfim! Parabéns pelo blog e continue a insistir!! =)
Pois é… Porque será que a justificação para a escolha do curso, por parte dessa aluna, não me surpreende?
Infelizmente ainda existem muitos profissionais, com os quais me vou cruzando, que assim pensão e intervêm. Que não conseguem ver mais além do que a simples caridade, com horizontes estreitos, colados e enraizados pelos ancestrais conceitos religiosos…pois é um leque de aspectos que não miram um empowerment e sobre os quais nos devemos questionar…
gosto particularmente desta passagem do prefácio à edição portuguesa do Diagnóstico Social de Mary Richmond de 1950 assinado por Fernando da Silva Correia: "ainda hoje é vulgar, como se sabe, confundir-se uma agente do Serviço Social com uma enfermeira improvisada, com uma bisbilhoteira, ou uma simples curiosa que não tem mais nada que fazer..." (p.xxxv)
A propósito do RSI, trago-vos um caso recente que se passou no meu contexto profissional e que penso espelhar a postura de alguns colegas nossos, em particular daqueles que trabalham em exclusividade na medida. O caso resume-se a um toxicodependente que beneficia da medida há já algum tempo (não sei precisar quanto, mas penso serem já uns bons aninhos). É um indivíduo ainda relativamente novo, na casa dos 30 e tais, com um trajectória de vida típica de um toxicodependente: iniciou o consumo na adolescência, possui uma retaguarda familiar disfuncional (e não estou a utilizar o termo por "dá cá aquela palha"), nunca exerceu qualquer actividade profissional. Como representante de um sector no NLI, defendi que esse indivíduo necessitava de um plano de acção que contemplasse o seu tratamento, já que nunca se tinha tentado devidamente, com um projecto concreto. Ou seja, o indivíduo era beneficiário do RSI ao longo deste tempo todo, sem um projecto de inserção que visasse o problema principal associado. Passado todo esse tempo, e depois de já ter passado por 3 colegas diferentes, lá trouxeram o caso ao NLI. O meu parecer - plano de acção objectivando o tratamento - foi imediatamente refutado pela colega gestora de caso. A ideia dela: encaminhar o indivíduo para a Pensão de Invalidez... Contrapus com o facto de essa situação colocar em risco um acompanhamento regular da situação, já que deixaria de estar ao abrigo de qualquer medida. Uma vez mais a colega refutou, alegando que ele seria acompanhado na mesma através do serviço de acção social da Segurança Social. Ora, como se sabe, à acção social só vai quem quer, e trata-se de um acompanhamento essencialmente esporádico, com medidas pecuniárias eventuais. Agora digam-me, como é possível acompanhar este tipo de situações, abdicando de uma lógica de empowerment e de advocacia social, para um conformismo preocupante, de arrumar os "meninos mal comportados" a um canto, "toma lá a pensãozinha, que depois logo te chamamos". Enfim, acho que é um exemplo paradigmático de como se vai trabalhando na nossa bela área social, e digo bela sem qualquer sarcasmo, desprezando tudo aquilo que se aprendeu, ou que se fingiu aprender, durante 5 anos de curso.
Assino por baixo da, ou do, colega "ad".
A descrição foi suficientemente clara para percebermos o que quer dizer, e qual o lado da razão (o seu, obviamente)
A sua argumentação é lógica, e parte de um pensamento técnico, de quem pretende, através da medida social RSI, tratar o principal problema detectado no diagnóstico social feito ao individuo e sua familia (aquando do pedido para receber RSI).
Ora, se como "bónus" da sua Não colaboração (é um típico caso de quem olha para o RSI, como uma pensão, ao estilo de invalidez(!)) na resolução do seu "mal", o beneficiário passa (se aprovar na Junta Médica) para um esquema de pensão de invalidez, e a não prestar contas a ninguém, continuamos com o seu problema, e quiça, tornando-se num provável marginal e que sustenta o vício com uma pensão paga por nós, contribuintes. (relembro que o individuo em questão nunca trabalhou - a avaliar pelo que diz a colega ad -, nunca tendo portanto contribuído para a sua pensão,e que provávelmente ficou inválido ou doente, por via do seu vício, conhecido dos técnicos do RSI, mas nunca tratado e sem direito a penalização, que seria o corte da prestação)
É, mais uma vez, varrer para debaixo do tapete. Triste. Lamentável. :(
Embora estejamos a falar de um ser humano em abstrato, lembro que o é, ponto1.
Ponto 2, quer uma quer outra colega apontam soluções dadas, imediatas, não sei se o ser Humano foi ouvido.
Ponto 3, Para usufruir de uma Pensão Social, esse ser humano no quadro descrito deve "possuir", ou ser possuido, por uma dessas doenças infecto contagiosas, estando, portanto legalmente abranjido por essa possibilidade.
Ponto 4, Outra questão é a da deontologia profissional, o ser humano em causa, embora isso possa ser danoso para o próprio pode não querer nenhum tratamento, a questão da autonomia.
Ponto 5, Nem sempre as práticas que parecem mais autónomas e arrojadas são as mais válidas depende da causística, requere uma forte avaliação e multidisciplinar, p.e., uma avaliação ao nível clinico-psicológico-psiquiátrico consistente sobre a validade de uma terapêutica e qual.
Ponto 6- A questão do RSI, é na sua génese e na sua consequência a manifestação de um Direito, como o Subsídio de Doença, de Desemprego, que visa a que nenhum indivíduo viva sem um minimo de dignidade. Hoje o Sub. de desemprego faz parte da rotina, no inicio também estava rotulado na "chusma da gamela". Nós profissionais, temos de ter consciência que para usufruir do RSI existem regras definidas, como para sair dele. E cada vez mais são as regras que têm de funcionar como noutros direitos e não o Assistente Social.
Uma coisa será partir do RSI para uma intervenção contratualizada com o cidadão, outra é obrigar o cidadão a ter um projecto com o Serviço Social. Quem está no desemprego ou com baixa médica não acontece tal. A independência do RSI enquanto direito é um avanço humano que como é lógico no plano admnistrativo terá de sofrer reajustes. A nossa intervenção nesta como noutras àreas deve-se pautar pela defesa da autodeterminação do cidadão, e não pela intrusão. Vamos muito céleres com a vox populi que pugna por linchar ou queimar na praça púiblica os benefeciários do RSI. Mas a nossa posição deve ser outra, reflexiva, enquadrada, é por estas e por outras que se queixam de não sermos ouvidos: Para opiniões do senso comum basta ouvir os programas abertos na SIC, TVI, na Rádio, bom mas presumivelmente nós seríamos os experts, acho eu...
Cara Colega:
É a primeira vez que comento o seu blog, apesar de já o "espreitar" regularmente há algum tempo.
Não posso deixar de a congratular pela qualidade patente em cada insistência e pela visão de desconstrução do mito do serviço social.
Nem de propósito... a tal aluna ainda é daquelas pessoas que associam o serviço social ao assistencialismo (completamente ultrapassado) e à caridade! A aluna só faltou dizer que o trabalho dos profissionais de serviço social é de Voluntariado!
Enfim... Perdoe-me o desabafo mas não me consegui conter!
Espero que continue a desenvolver um excelente trabalho no que toca a despertar consciências dos mais distraídos nestas matérias!
Obrigado!
Ass: Susana Dias
Agradeço o incentivo, Susana. Volte sempre!
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