27.8.08

posicionamento e memória: a propósito de uma velha carta de alunos sobre a integração do ISSSL na Lusíada

Foi divulgado um documento de 2006 que se intitula "Carta dos Estudantes do Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa – ISSSL como forma de Pressão Para Aderirem à Opção de Venda do Património à Fundação Minerva (Universidade Lusíada)". Esta dirigia-se aos professores que se encontravam na altura em litígio, segundo percebi, com esta situação de transferência e que defendem a integração do ISSSL no ensino público.
Apesar do desfasamento temporal, porque só agora tomei conhecimento da carta, gostaria de tecer um pequeno comentário atendendo às memórias que me trouxe. Eu tenho uma posição genérica sobre estas circunstâncias que se poderia aplicar a esta situação concreta, mas, por uma questão deontológica e por apenas superficialmente conhecer os seus contornos, não a colocarei na praça pública.
No entanto, esta posição dos alunos (que não sei se representava a maioria dos estudantes de 2006), que compreendo atendendo ao avançar dos factos e das circunstâncias actuais do ensino superior, remete-me para 1991 quando era eu aluna do ISSSC. Este esteve em vias de "morrer" com jogadas de bastidores que me escaparam na altura e que vieram a criar o ISBB em Coimbra, talvez o único curso em Portugal criado com 5 anos simultaneamente em funcionamento. Só vos quero dizer que não fiz parte dos alunos que embarcaram neste projecto que era apresentado como "salvador". "Salvador" relativamente a quê, nunca entendi! Fiquei no ISSSC e nunca me arrependi. Muito aprendi com as dificuldades que atravessámos, mas ficou-me o sabor de ter participado na sua "reconstrução". Salvou-se um pedaço de história. Às vezes é necessário, outras vezes é fundamental saber encarar as transformações! Sobretudo, nas decisões a tomar têm de ser preservados os valores acima das circunstâncias, ainda que nem sempre estes consigam emergir sobre as últimas. A história está cheia de lições, é necessário olhar bem para o que está em causa e tomar partido relativamente ao que se entende ser o melhor e não o mais fácil ou mais acessível. Nem sempre essas são as melhores vias para fazer parte da história.
Nota: a carta chegou-me via e-mail, em PDF, através de uma entidade que promove a informação na área do serviço Social e afins. Só posteriormente me apercebi da data.

3 comentários:

Duarte disse...

Nestas situações de nada serve atacar os alunos que mal ou bem acabam sempre por ser as principais vítimas. Todos eles foram prejudicados e sempre seriam independentemente do desfecho final, o qual até acaba por ser secundário. A integridade dos alunos deveria ser sagrada, quer estejam a favor, quer estejam contra. Muitas vezes os alunos são transformados em armas de arremeço político e isso é inaceitável. A maioria deles não tem maturidade, nem conhecimentos suficientes para adoptar posições totalmente coerentes, daí que passado algum tempo acabem por se arrepender. É a volatilidade normal nos estudantes. O processo do ISSSL, o qual conheço minimamente, sobretudo o seu início, deve-se a graves erros do passado cometidos por gestões danosas que acumularam dívidas, prejuízos, enfim, todo um compêncio de más práticas de gestão. Ninguém precaveu o futuro, ou seja, o advento de novas faculdades, muitas delas públicas, que com certeza iriam fazer diminuir o número de inscrições no ISSSL. Isso por si só, no entanto, não serviria para hipotecar uma instituição com tantos anos de história, caso tivesse havido maior sensatez na sua gestão ao longo dos anos, diria mesmo, décadas. Quanto aos caminhos que acabaram por estar em jogo - integração no público ou transferência dentro do privado - a verdade é que sempre duvidei da possibilidade de o Estado autorizar a aquisição de uma instituição de ensino superior privado com tantas dívidas acumuladas. Quem as pagaria? O Estado? Não sou especialista na área do direito, mas não me parece que tal fosse possível, tendo em conta, sobretudo, o estado das contas públicas. Também não me agradou o desfecho final, e a verdade é que desconheço o actual estado das coisas. Mas caso o ISSSL integrado na fundação Minerva/Universidade Lusiada, esteja a funcionar bem, com um ensino de qualidade, tendo docentes especalizados em Serviço Social, então teremos de aceitar essa decisão. Ah e ainda havia outro pormenor: as condições logísticas do edifício do ISSSL. Eram de facto vergonhosas para o funcionamento de uma instituição de ensino superior em pleno século XXI e com a vinda de Bolonha. Houve dois projectos que chegaram a ser anunciados aos alunos como a promessa de mudança para novas instalações: uma passava pela restauração de um palacete na zona do Rato (Lisboa), o qual possuía apenas as paredes. Tudo o resto apresentava um estado de degradação arrepiante; o outro, seria a construção de um edifício de raiz, supostamente na zona da alta de Lisboa, com um terreno cedido por uma das autarquias limítrofes. Nada daquilo foi para a frente, pois naturalmente não havia dinheiro. Houve diversos ultimatos por parte do Ministério do Ensino Superior, o qual avisou que o ISSSL naquelas condições é que não poderia funcionar. Ou seja, também este dado pesou no desfecho final e acredito que, pelo menos agora, os alunos e docentes usufruirão de melhores condições de trabalho. Espero não ser mal interpretado, pois, repito, não fui, nem sou, defensor do desfecho final, mas considero que é necessário haver algum realismo nestas matérias e utilizar uma balança bem afinada...

joaquim disse...

Eu sei que não serei a pessoa ideal para escrever aqui, mas este assunto que tomei conhecimento indirectamente e para o qual me foi pedido um parecer na altura como Presidente da então Comissão administrativa da AIDSS, é um assunto que dói a quem o viveu, que mexe com a história do serviço social, mas penso agora, que o Duarte tem toda a razão (até porque conhece bem o assunto), e com o tempo virá ao de cima a racionalidade e as paixões diminuirão (embora com certeza para alguns fique a mágoa), e talvez se possa fazer uma história mais correcta dos acontecimentos.
Neste momento pelo menos o nome ISSSL existe, assim como o Curso, e vamos ver aonde vai o caminho, estejamos atentos e como diz o Duarte os estudantes nunca deveriam ser os protagonistas desta e doutras histórias, mas é assim, em situação de guerra por vezes...

S Guadalupe disse...

Se não seve ser fácil gerir um instituição destas, pela natureza não supostamente lucrativa das suas actividades, também não deve ser fácil gerir as saídas para a crise.

Aprendi que crise é simultaneamente oportunidade e risco. Oportunidade de mudança e crescimento, mas risco de impasse...

Os alunos, que nunca têm a percepção da história em que eles próprio participam, são sempre apanhados nestas situações e nunca se consegue salvaguardar totalmente a sua paz e sossego.

Também eu era aluna, imagina, saída do 1º ano, tinha 18 anos ainda quando fui apanhada numa situação surrealista. Alguns contornos ainda estou para percerber hoje. E a nossa situação foi mais grave, pois houve divisão e guerras entre alunos, o que se perpetuou numa rivalidade entre as escolas, que entretanto se dissipou e até se chegou a falar em fusão.

Aprendi muito, participei na comissão instaladora da Associação de Estudantes, que havia ficado numa situação deplorável (sem qualquer documento, etc). Aprendi sobretudo a ter ums perspectiva crítica sobre os zunzuns que se ouviam daqui e dali, aprendi a equacionar questões e respostas, aprendi a posicionar-me e a assumir consequências. Acho que foi uma escola para a vida, mas que não desejo a todos. Lá consegui, no entanto, e pelo meio, tentar ser a boa aluna que me reconhecia. Mas muito mais do que uma média de curso, ficou-me a marca desta experiência conturbada.

Os alunos vão ser profissionais e vão ter relações profissionais, alguns poderão passar pelas situações e que alguns dos professores e funcionários a quem dirigiram a carta passaram. Não me identifico minimamente com o tom agressivo e desqualificante da carta, pois trata-se de por em causa pessoas que lutavam pelos seus direitos.

Mas, compreendo: nos conflitos é sempre assim...