18.10.08

curiosidades e confusões de cursos e profissões

A beneficiária do "rendimento mínimo" que passou a avaliar os candidatos ao subsídio


Madalena Quiela beneficiou durante cinco anos do Rendimento Social de Inserção (RSI), período durante o qual se licenciou em Serviço Social e passou para o lado oposto, avaliando agora os beneficiários do apoio que já recebeu.
A mulher de 29 anos, natural de Angola, considera que o RSI a ajudou a superar alguns problemas financeiros, nomeadamente na concretização dos estudos, depois de ter “ficado abandonada à sua sorte”, mas afirma que “a determinação e a força é que a fizeram vencer os obstáculos da vida”. O sonho de ser enfermeira não se concretizou, mas sente-se realizada “ao contribuir para a melhoria e satisfação de pessoas necessitadas que recorrem ao Rendimento Social de Inserção”, após concluir o curso de Educação e Intervenção Comunitária (Assistente Social), na Universidade do Algarve.
Madalena chegou a Portugal em 1988, com apenas nove anos, trazida pela madrinha, “uma senhora de Olhão, mas que residiu durante muitos anos em Angola, com posses financeiras, que resolveu proporcionar uma vida melhor a uma das duas irmãs suas afilhadas angolanas”, contou Madalena à agência Lusa.“Os meus pais viviam com grandes dificuldades económicas e dificilmente conseguiam sustentar os onze filhos, por isso decidiram mandar-me a mim porque era a mais velha”, recordou a jovem. Ao chegar a Portugal, Madalena viveu e iniciou os estudos em Lisboa, mas ao fim de dois anos a madrinha decidiu regressar a Olhão, a sua cidade de origem. Durante oito anos, a madrinha não lhe deixou faltar nada. “Tinha tudo, roupa, comida, dormida, dinheiro, amor e carinho”, observou.Mas, aos 17 anos, a morte da madrinha, que não fez testamento, retirou-lhe tudo aquilo a que se habituara e que “sempre sonhou”, passando a sua vida a “ser um pesadelo”.“As duas filhas da minha madrinha chegaram e disseram que não podiam ficar comigo, propondo-me regressar para Luanda ou ir para junto do meu pai que, entretanto, havia saído de Angola para a Bélgica”, recordou.Perante as opções, e porque a situação social da mãe com os dez irmãos “não era a melhor" e o pai estava na Bélgica como refugiado político, também "sem grandes posses" para a acolher, Madalena decidiu ficar em Olhão, em casa de um casal vizinho que não se importou de a receber, contou à Lusa .Ao atingir a maioridade e sem nunca abandonar os estudos, Madó - como gosta que lhe chamem os amigos -, foi viver para casa de uma colega e decidiu recorrer ao Rendimento Social de Inserção (RSI), “indicado por uma amiga enfermeira para fazer face a despesas com os estudos”.“Meti os papéis e quando menos esperava recebi uma carta a anunciar a atribuição do subsídio, cerca de 26 contos, actualmente cerca de 125 euros”, recordou a jovem angolana.
Com o dinheiro do RSI e mais algum que conseguia amealhar com trabalhos que efectuava no Verão, licenciou-se em Educação e Intervenção Comunitária na Universidade do Algarve. Depois de enviar o currículo e de se candidatar a vários organismos, Madalena foi chamada pela Câmara de Albufeira, onde fez um estágio durante dois anos.“Assim que iniciei o estágio comuniquei que já não necessitava do RSI, passando a usufruir de rendimentos próprios para a minha subsistência”, referiu.“Essa subsistência permitiu-me já rever os meus pais e irmãos em Angola, o que para mim é extremamente gratificante”, recorda com lágrimas nos olhos. Actualmente, Madalena Quiela integra o grupo de avaliação e acompanhamento do Rendimento Social de Inserção no Centro Comunitário da Fundação António Aleixo, em Quarteira, onde avalia os candidatos a beneficiários da ajuda estatal.
Fonte: Barlavento 17 de Outubro de 2008
Notas:
A situação retratada é interessante e merece reflexão
A situação trazida como paralela denuncia, uma vez mais, a confusão a que esta área profissional está votada. A designação do curso remete para Educador Social e não para Assistente Social. Fui ver quais as áreas científicas do curso actual da Universidade referida. Apenas encontrei o curso de Educação Social (devem ter sido obrigados a optar por uma designação genérica, com o processo de Bolonha). Neste não é referida a área científica de Serviço Social nem as saídas profissionais remetem para esta profissão. No entanto, as atribuições funcionais da pessoa retratada na notícia revelam que a sua licenciatura a terá habilitado para exercer funções na área do Serviço Social.
Provavelmente estas situações também acontecerão noutras áreas. Ainda assim, é por demais evidente que o acesso à profissão não é devidamente regulamentado. É mais um caso que o comprova.

7 comentários:

Carpediem disse...

Cara colega. Realmente a noticia tem alguns erros. A Colega tirou Educação e Intervenção Comunitária que com o Bolonha passou a Educação Social. Há que referir que desempenha funções de um educador social e não de um assistente social pois a equipa que esta integrada tem um tecnico especializado nessa àrea.
Mais uma vez muitos parabéns à Madalena Quiala, pois a noticia apenas retrata um pouco das dificuldades que passou. Conheço-a de perto e é um verdadeiro caso de sucesso.

S Guadalupe disse...

CarpeDiem,
Agradeço o esclarecimento. Não quero desvalorizar a situação retratada, mas é tão frequente haver estas confusões... Depois dá a entender que a educadora social estaria a fazer diagnósticos sociais, que, no meu entender, devem ser da exclusiva responsabilidade do assistente social. Isso é preocupante.
Obrigada!
SG

Duarte disse...

As equipas do RSI quando foram idealizadas preconizavam um trabalho multidisciplinar. Na prática essa multidisciplinaridade nunca existiu. Temos equipas com assistente social, educador, psicólogo que acabam por fazer exactamente o mesmo. Pessoalmente defendo que as equipas deviam ser constituídas, primeiro por assistentes sociais como os gestores de caso, complementando-se depois com psicólogos para efectuarem apenas acompanhamento especializado e educadores sociais que realmente desenvolvessem funções nessa área. O que acontece é que no que toca a estes profissionais, na esmagadora maioria dos casos não se conseguem distinguir do trabalho dos assistentes sociais. Nuns casos porque lhes são impostas linhas de intervenção, mas noutros porque lhes sai mais cómodo serem confundidos como assistentes sociais porque lhes dá um maior protagonismo e maior identificação social, sendo, porventura e talvez, um trabalho "mais cómodo". A pergunta que se coloca é o que deveria fazer um educador social? A resposta teria que passar por desempenhar funções que se distinguissem realmente das do assistente social. E não me refiro apenas ao RSI, mas também nalgumas IPSS e autarquias em que há uma confusão de papéis. Daí ser normal que depois para a generalidade das pessoas leigas na matéria - a começar no público-alvo - e até para os media, acabem por ser todos confundidos com os assistentes sociais. Portanto, há alguém que está mal neste filme e não somos nós com certeza. E já agora quem fala dos educadores sociais, fala também dos sociólogos e até alguns psicólogos (conheço inúmeros exemplos nesse sentido).

Duarte disse...

Artigo 358º (Código Penal)
Usurpação de funções
 
Quem:
a) Sem para tal estar autorizado, exercer funções ou praticar actos próprios de funcionário, de comando militar ou de força de segurança pública, arrogando-se, expressa ou tacitamente, essa qualidade;
b) Exercer profissão ou praticar acto próprio de uma profissão para a qual a lei exige título ou preenchimento de certas condições, arrogando-se, expressa ou tacitamente, possuí-lo ou preenchê-las, quando o não possui ou as não preenche; ou
c) Continuar no exercício de funções públicas, depois de lhe ter sido oficialmente notificada demissão ou suspensão de funções;
é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
 
(Redacção da Lei nº 65/98, de 2 de Setembro)

Unknown disse...

É mais uma situação que justifica a criação urgente de uma Ordem dos assistentes sociais

Silvia Azevedo disse...

Caros colegas,

Um Educador Social não é de facto, um assistente social, e ainda bem pois senão não faria sentido o seu trabalho multi e plurisciplinar que desenvolve com outros técnicos nomeadamente os assistentes sociais.

Um Educador Social intervêm numa lógica educacional, a sua metodologia base são a educação e o trabalho de competências sociais, pessoais e profissionais dos cidadãos com vista a criar a autonomia das pessoas nos seus processos de vida, permitindo-o crescer e aperfeiçoar-se enquanto pessoa e melhorando a sua qualidade de vida. De facto e temos de admiti-lo, que muitas das vezes as intervenções se confundem, até porque apesar das metodologias de intervenção serem diferentes, a àrea de intervenção (social) é a mesma.O mesmo acontece ainda hoje com os Psicólogos e Psiquiatras.

O importante na minha opinião é que ambas as profissões se unam precisamente para desenvolver as diferenças de ambas as profissões e isso passa por ambas se conhecerem bem.

Nós os Educadores Sociais licenciados, temos uma Associação Profissional, um sindicato e um grupo de trabalho e nesse sentido lanço um desafio; aproximar ambas as profissiões e associações para desenvolverem conjuntamente uma linha de orientação e de coadjuvação de trabalho com a finalidade de criar equipas multi e pluridisciplinares. O problema ddas confusões de funções são provocadas muitas vezes por má coordenação de equipas, como por exemplo no RSI, em que saõ tantos processos, que acabam por ser divididos por técnicos e não por terem cada processo uma intervenção pluridisciplinar. MAs isso é um problema que já parte dos organismos superiores ou de quem coordena determinada equipa.

Eu própria sempre trabalhei com colgas assistentes sociais e sempre soubemos muito bem distinguir e aproximar papeis para um trabalho mais enriquecedor.

Cabe ao educador social do RSI, entre outras funções;

- Estabelecer uma relação de proximidade e de confiança com a família e um conhecimento adequado das dinâmicas familiares

- Estabelecer prioridades e criar condições para o envolvimento activo da família nas das acções que integram o programa de inserção

- Apoiar as famílias, no processo de intervenção estimulando a participação de toda a família

- Desenvolver autonomia nas tarefas do quotidiano familiar, numa perspectiva pedagógica e de suporte à sua realização,incorporando novas aprendizagens, com vista a uma melhor organização familiar e economia doméstica

- Educar para a saúde e para os cuidados pessoais

- Estimular e desenvolver com a família conhecimentos sobre as diversas áreas das competências familiares e sociais básicas

- Promover integração grupal e social

- Planear, organizar e desenvolver actividades na comunidade ou no domicílio

- Incentivar os indivíduos a desenvolver a sua criatividade e inovação entre outras.

O que acontece é que sendo a educação social uma àrea mais recente do que serviço social, leva a que muitos dos chamados "leigos" por um dos colegas do blog, pensem que os dois educadores sociais e os assistentes sociais são os mesmos téncnicos. Foi o que aconteceu de certeza com a informação apresentada no jornal de Baralavente.

Os Educadores Sociais, tem Estatuto, tem uma Associação Profissional e um Sindicato, que defende a sua identidade e nunca quererão tirar funções ou repeti-las quando estas são de outros profissionais. Nem quer tambem que outros o façam e isso tambem acontece. Como exemplo a àrea das Competências parentais, área iniciada pelos educadores sociais e que hoje se encontra a ser desenvolvida por vários interventores.


Saudações educativo-sociais,

Sílvia Azevedo

Presidente da Associação dos Profissionais Técnicos Superiores de Educação Social(APTSES)

Membro da Direcção do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Solidariedade e Segurança Social

Docente da Licenciatura de Educação Social da Universidade Portucalense

Fundadora do Grupo 1 º de Trabalho Nacional de Educação Social (desde 2001)

Unknown disse...

A necesssidade do RSI.

Neste momento de rendimentos mensais usufruo do ordenado de 530 euros do meu marido ,do subsídio de deficiência de 59 euros do meu filho , do subsídio de terceiros de 88 euros e os abonos. Por este motivo senti-me obrigada a pedir o subsídio RSI para poder ajudar nas despesas porque tenho o meu filho de 4 anos portador de um sindrome raro que o deixa com 95% de incapacidade [ não vê, não fala, não anda e sofre de irritablidade que o leva á auto-agressão ] é uma criança que usa fraldas, toma diariamente 3 medicações e a sua alimentação é muito restrita. Para o poder acompanhar ás consultas, ás sessões de fisioterapia e por ser ele uma criança muito instável devido á sua irritablidade, eu não posso trabalhar para o poder acompanhar e cuidar dele como merece e necessita.De 250 euros que recebia estou apenas agora a receber 71 euros e é muito difícil lidar com esta situação, torna-se até revoltante por ver tantas pessoas com os filhos saudáveis que não querem trabalhar a viver á custa dos subsídios sociais e eu que não posso estão me tirar a pouca ajuda que dão. É este o País que vivemos.