6.6.11

a propósito de programas de intervenção nas famílias

Por vezes os objectivos podem ser tidos por nobres, mas os meios são aberrantes. Não posso discordar mais da proposta deste "Projecto Família" do MDV. Não será estranho, porque não partilho das mesmas ideias que guiam quem o propõe. Mas não posso deixar de sublinhar que o carácter normalizador do projecto me repugna mais do que assusta.

Esta ideia de "educar-normalizar" em vez de "capacitar-emancipar", em vez de olhar para as pessoas como cidadãos com os mesmos direitos que todos, ainda que oprimidos por problemas assusta-me, principalmente porque não vejo ninguém a colocar em causa e a discutir estas alternativas. É também o caso da chamada educação parental. Só a sua designação passa um atestado de incompetência a quem os integra. Não coloco em causa os objectivos mas os princípios, ainda que estes possam contaminar-se mutuamente. As famílias desafiadas pelos problemas sociais com que lidam não são piores do que ninguém, só lidam com problemas diferentes e graves com os quais a maioria de nós (que não lida com tais problemas) não conseguiria lidar também, certamente. A sua trajectória e a sua situação não permite potenciar as suas capacidades plenamente.

Todos somos (mais/menos) competentes e (mais/menos) incompetentes numa ou noutra área. O que pode significar esta ideia para quem pensa assim? Aceitamos que tais modelos de intervenção sejam assim implementados?

7 comentários:

fcorreia disse...

Sou técnica superiorde serviço social e uma defensora acérrima do "empowerment" na intervenção social. Concordo consigo, mas tenho noção que muitos profissionais vão desenvolvendo estes programas sem questionar e sem se colocarem no lugar do outro! Esta questão da normalização, sem ter em conta as perspectivas do sujeito, o seu ponto de vista, os seus interesses e expectativas é ainda um erro de grande parte dos profissionais da área social no geral, grande parte deles motivados pela exigências da organização!

S Guadalupe disse...

Pois, a intervenção acrítica é algo bastante preocupante. Mas este paternalismo é algo que tem de frontalmente ser debatido, senão continua a propagar-se...

S Guadalupe disse...

Já agora, preferia que se afirmasse como Assistente Social (a nossa profissão)... em vez de usar o título correspondente à carreira técnica.
É uma questão antiga esta...

joaquim paulo silva disse...

Sónia,
parece-m também evidente que o MDV tem uma agenda por detrás do discurso da família, e que aflorou recentemente na campanha...o problema é exatamente, e independentemente, quais são para nós Assistentes Sociais os valores essenciais na Intervenção Social, nomeadamente com a família, que traduzam uma força ético-sócio-política fundamental. Sem dúvida, pelo menos a mim parece, que estes não são os valores éticos do Serviço Social, de um Serviço Social que se compromete com a autonomia, liberdade, equidade, identificação do ser humano com um outros, sem nos situarmos num outro patamar...no entanto, esta
é também uma opção política dos Assistentes Sociais, no seu coletivo, porque se não for é evidente que as organizações aonde exercem atividade profissional podem fatalmente condicionar e até reformatar práticas. A urgência de um Código de Ética Nacional e sua discussão, ajudariam...mas como tudo está interligado com a Ordem...enfim...

S Guadalupe disse...

Aliás, só a ideia de defesa da vida remete-nos para campos onde nem quero entrar...

De facto, Joaquim, isto é uma pescadinha de rabo na boca. Agora neste novo cenário vamos ver no que isto dá...

Duarte disse...

O colega Joaquim tirou-me as palavras da boca, como se costuma dizer. Mas independentemente das questões políticas e organizacionais, há uma responsabilidade individual em cada profissional, no caso, ASSISTENTE SOCIAL (e não essa "estória" de técnico de serviço social), na condução do seu trabalho. Não temos que esperar por uma ordem, nem por uma qualquer diretiva seja de que lado for, para adoptarmos determinados comportamentos e abandonarmos outros. A intervenção acrítica é um quotidiano na nossa classe. De que precisam as pessoas, no caso, assistentes sociais, para alterarem este comportamento? Para se preocuparem com a cultura profissional que deveriam transmitir? Porque raio há tantos relatórios e diagnósticos sociais mal elaborados? Porque raio há tantos que não sabem realizar uma entrevista ajustada ao processo de intervenção social? Porque raio tão poucos refletem, quer sobre as problemáticas com que trabalham, quer sobre a realidade da profissão que desempenham (e lhes paga). Afinal todos gostam de ser e de auferir como licenciados, de serem tratados por "Dr.", mas ao mesmo tempo não se importam com tanto amadorismo? Haverá, com certeza, uma quota parte de responsabilidade por parte do estado, enquanto entidade reguladora do ensino superior em Portugal, neste caso, na organização da formação em Serviço Social. Quando os governos não se preocupam em ter bons profissionais na operacionalização das políticas que eles criam, e portanto, são negligentes para com todo o dinheiro que é investido na malha de políticas sociais nos múltiplos sectores existentes, pois quanto piores profissionais houver, mais prejuízo se terá, então penso que continuaremos nesta situação, em que a formação do Assistente Social em Portugal, continuará a ser vista como algo menor. Só que menor não é o dinheiro que é de todos nós e que é investido. É uma perspectiva que tem de ser considerada, por muito que nos custe.

Ana Bolsa disse...

Olá Sónia e colegas
Sugeria um encontro nacional, desta vez mais central (em termos territorias e não só a sul)de modo a debatermos estas questões- o papel do serviço social nestes tempos de mudança de paradigma (sócio-económico). A importância da ética profissional e da justiça social nestes periodos conturbados.